terça-feira, 18 de setembro de 2018



18 DE SETEMBRO DE 2018
CARLOS GERBASE

NÃO É. NÃO É MESMO!

Recordar não é viver. Memórias são importantes. Elas nos ensinam, elas constituem nossa subjetividade, mas elas não substituem a vida, que é um conjunto de manifestações bioquímicas rumo ao misterioso futuro de cada indivíduo e de cada espécie. Quem vive do passado não é museu. É apenas um ser que desistiu de viver e espera a morte. Que, cansado, às vezes deprimido, acha que não vale a pena planejar o almoço de domingo. Quem sabe, se visitasse um bom museu ainda não incendiado, encontraria motivos para seguir em frente.

Amar não é mudar a alma de casa. É apenas um verso feito para fazer rimar as palavras "casa" e "extravasa". É uma frase que não tem sentido algum fora da poesia de Mário Quintana. Se temos uma alma, ou alguma coisa não material que convencionamos chamar de alma, ela, infelizmente, não muda de casa. Ela, no máximo, deseja sair de casa e sofre por não conseguir.

Cinema não é a melhor diversão. Essa frase foi criada pelos donos das salas de cinema, que na verdade acham que cinema é a melhor maneira de ganhar dinheiro. Literatura é uma diversão narrativa mais antiga, mais diversificada esteticamente e mais desafiadora para nossos cérebros. Cinema também não é a sétima arte. É a oitava. A sétima é a fotografia, uns 70 anos mais antiga, e um suposto cineasta que não conhece o valor da literatura e da fotografia deveria ficar bem longe de roteiros e câmeras.

Política não é a arte de enganar o povo. Quem diz isso não é apenas um cínico. É um indivíduo perigoso, que está a um passo do fascismo. Fazer política é lutar todos os dias para não enganar o povo. É compreender As Suplicantes, peça de Eurípedes, e fazer como Teseu, rei de Atenas: consultar a população antes de entrar numa guerra, mesmo que isso seja demorado e complicado, para que a responsabilidade da decisão seja compartilhada, e até a eventual morte no campo de batalha tenha sentido.

Viver de verdade é superar o passado, lutar para que a alma se sinta bem onde está, ler muito antes e depois de ir ao cinema, suportar estoicamente as dificuldades da democracia. Escrever não é reescrever. E não é mesmo! Se fosse, esse texto não estaria aqui, agora, à sua disposição. Escrever é finalmente colocar um ponto final e deixar o texto fluir rumo ao seu único destino: você.

CARLOS GERBASE