terça-feira, 25 de setembro de 2018



25 DE SETEMBRO DE 2018
DAVID COIMBRA

O que o Brasil pode copiar dos Estados Unidos

Há um ótimo restaurante português bem perto de onde moro, fica do outro lado do rio, em Cambridge, a terra de Harvard. Vou lá sempre e sempre faço o mesmo pedido: bolinhos de bacalhau de entrada, bacalhau à Gomes de Sá como prato principal e vinho verde gelado para acompanhar.

Neste fim de semana, eu, a Marcinha e o Bernardo fomos jantar lá. É um deslocamento curto, 10 minutos de carro. Chamamos um Uber, nos acomodamos no banco de trás e o motorista começou a conversar. Era um tipo simpático, alegre. De repente, o Bernardo falou algo em português, e ele:

- Vocês são brasileiros?

Nos surpreendemos: - Você também?

Não. Ele era de Angola. Chama-se Miguel. Tem uns 30 anos de idade e há 20 mora nos Estados Unidos. Mas conhece muitos brasileiros, contou que o Brasil exerce grande influência sobre Angola e falou inclusive dos negócios da Odebrecht na África, da Lava-Jato e da amizade que Lula tinha com o homem que há mais de 30 anos manda na política angolana, José Eduardo dos Santos.

Percebi que Miguel diminuiu a velocidade para a conversa durar mais. Ele estava empolgado. Discorria sobre as belezas e as grandezas do Brasil e, quando já estávamos chegando ao restaurante, questionou, depois de um suspiro:

- Por que o Brasil não é um Estados Unidos da América Latina?

Descemos do carro levando essa pergunta nos bolsos dos casacos. Porque, de fato, o Brasil tem muito a ver com os Estados Unidos. Incomoda-me quando alguém compara o Brasil, por exemplo, à Finlândia, à Noruega, ao Japão. É como se nos comparassem com algum lugar de Alpha Centauri. Com os Estados Unidos é diferente. Brasil e Estados Unidos são países irmãos. Ambos se espalham pela América e foram descobertos pelos europeus mais ou menos na mesma época. Ambos são continentais, dentro deles cabem Alemanhas, Franças e Inglaterras somadas. A população de ambos é formada por imigrantes ou descendentes de imigrantes do mundo inteiro. E ambos ainda sofrem com as dores causadas por uma doença maldita: a escravidão.

A História com agá maiúsculo é que nos distanciou, sei bem. Mas e agora? O que poderíamos fazer AGORA para que o Brasil reproduzisse as boas experiências americanas, sem se esquecer de rechaçar as ruins?

Vivendo aqui há tanto tempo, aprendi um pouco sobre o que torna robustos os Estados Unidos. Não são as grandes coisas: são as pequenas. É, sobretudo, a noção de que qualquer indivíduo tem a sua autonomia, a sua liberdade, a sua individualidade, a sua privacidade. Num país que nunca teve rei ou ditador, o indivíduo é o rei e o ditador de si mesmo.

Mas não quero filosofar. Não. Quero falar de algo prático, real e tangível: o sistema administrativo dos Estados Unidos, que não só poderia, deveria ser imitado pelo Brasil. Esse sistema, que faz dos Estados Unidos uma máquina de progresso, empregos, justiça e bem-estar, esse sistema está melancolicamente distorcido no Brasil. Pior: está distorcido pelo que o Brasil tem de mais pujante e até de mais moderno. O que será? Conto amanhã.

DAVID COIMBRA