sábado, 29 de setembro de 2018



29 DE SETEMBRO DE 2018
DRAUZIO VARELLA

RENÚNCIAS E REMENDAS

O SUS completa 30 anos de existência. É o maior sistema público de saúde do mundo; país nenhum com mais de 100 milhões de habitantes oferece cuidados de saúde para todos.

Mediado pela jornalista Cláudia Collucci, o jornal Folha de S.Paulo realizou um debate sobre dois dos gargalos que mais prejudicam a eficiência do SUS: as renúncias fiscais e as emendas parlamentares. As discussões mantidas no encontro foram comentadas pelos jornalistas Leonardo Neiva e Beatriz Maia. Vou resumi-las:

1) Segundo Mauro Junqueira, presidente do Conselho Nacional das Secretarias Municipais de Saúde, o conjunto das renúncias fiscais do governo federal previstas para 2018 é de R$ 283,4 bilhões. Esse número ultrapassa o dobro do orçamento do Ministério da Saúde no ano de 2017, que foi de R$ 125,3 bilhões.

2) No montante dessas renúncias não estão incluídas as deduções dos gastos com saúde no Imposto de Renda.

3) Os participantes levantaram um ponto raramente discutido: as isenções na produção de motos e bebidas açucaradas na Zona Franca de Manaus. Cerca de 98% das motos que circulam nas cidades brasileiras são produzidas em Manaus, com benefícios fiscais. Elas são responsáveis por um terço das mortes em acidentes de trânsito, por aposentadorias precoces e despesas com tratamento e recuperação dos acidentados, que sobrecarregam o SUS. Refrigerantes e outras bebidas açucaradas, que tanto colaboram para a epidemia de obesidade que se dissemina pelo país, são beneficiados pelo mesmo sistema de isenções. Semanas atrás, uma das maiores companhias ameaçou deixar o país, caso perdesse essas benesses. Um de seus diretores ameaçou: "Iremos para um dos países vizinhos e o Brasil terá de importar nossos produtos".

4) Leonardo Vilela, presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde, chamou atenção para uma das excrescências da nossa administração pública: as emendas parlamentares, através das quais deputados e senadores se intrometem no sistema de saúde, alocando verbas para a construção de centros hospitalares em seus currais eleitorais e para a compra de equipamentos inadequados para os locais a que se destinam. Neste ano, o governo gastará R$ 8,8 bilhões com essas emendas impositivas garantidas pela Constituição.

5) Os técnicos asseguram que, para ter viabilidade técnica e econômica, um hospital deve ter pelo menos de 200 a 300 leitos. No Brasil, 55% dos hospitais têm menos de 50 leitos; cerca de 80% não chegam aos cem leitos. Jocelino de Menezes, secretário-executivo do Ministério da Saúde, resumiu o pensamento dos especialistas: "Essa epidemia de emendas parlamentares é uma doença genuinamente brasileira, que precisa ser erradicada. Não podemos fazer gestão por meio de emendas e, pior ainda, de emendas impositivas".

6) Mônica Viegas, professora da Universidade Federal de Minas Gerais, chamou atenção para a relevância social do SUS: "É a maior política de transferência de renda que temos no Brasil, funciona mais até do que o Bolsa Família".

DRAUZIO VARELLA