terça-feira, 14 de janeiro de 2020



14 DE JANEIRO DE 2020
DAVID COIMBRA

Vou torcer contra o Brasil no Oscar

Vou torcer contra o documentário brasileiro indicado ao Oscar. Não porque Democracia em Vertigem iluda o espectador quanto à forma. Ao contrário, o filme é bastante sincero, assumida e devotamente pró-PT. Disfarçadamente, porém, não passa de uma peça publicitária do partido e de bajulação a Lula. Sua diretora, Petra Costa, é petista-raiz, o que fica claro no enredo, que conta a história da relação da família dela com o partido. E, não por acaso, a família em questão chama-se Andrade Gutierrez, que tanto se refocilou no dinheiro do contribuinte brasileiro nos governos petistas.

Os méritos do filme, aliás, se dão por conta dessa intimidade. Petra obteve acesso privilegiado aos ambientes em que circulavam Dilma e Lula durante o período que começou com o impeachment dela e terminou com a prisão dele. São imagens preciosas, porque únicas. Você pode ver a expressão do rosto de Dilma em meio à votação do impeachment na Câmara e a azáfama no Sindicato dos Metalúrgicos em meio à negociação para que Lula se entregasse aos agentes da Polícia Federal.

Isso, como ressaltei, na forma. O problema está no conteúdo. Porque o documentário é de uma desonestidade assombrosa. A começar pelo título. A democracia brasileira não está em processo de queda. Ao contrário: nunca esteve tão forte. Tanto que mesmo um presidente antidemocrático, truculento e grosseiro, como Bolsonaro, tem de se submeter a ela.

Não faz muito, um dos filhos de Bolsonaro deu declarações sugerindo que uma medida como o AI-5 poderia ser implantada novamente no Brasil. É claro que Bolsonaro adoraria algo do gênero. Seu sonho mal contido seria governar como ditador. Mas ele se apressou a ir a público para desautorizar o filho e censurá-lo por causa da citação ao AI-5. Por quê? Porque ele sabe que as instituições democráticas brasileiras são sólidas, estão acima dele e não admitem arroubos autoritários.

Foram essas mesmas instituições que primeiro prenderam Lula e depois o soltaram. Lula não saiu da prisão por pressão popular (que não houve) ou por indignação internacional (que também não houve). Saiu por meios legais.

Foram as instituições que removeram Dilma do poder após um julgamento amplo e exaustivo e que puniram a promiscuidade criminosa do PT com empreiteiras como a Andrade Gutierrez. Nenhum país no mundo combateu com maior vigor a corrupção do que o Brasil nesses últimos anos. Nenhum teve mais sucesso nessa luta. Graças à pujança da democracia brasileira.

Petra Costa, no entanto, faz uma narração dramática desse período, como se o país estivesse em perigo. Chega a afirmar, com voz sumida de quem está num funeral, que o Brasil "avança rapidamente para o seu passado autoritário". Isso não é uma opinião. Isso é uma mentira.

Democracia em Vertigem foi indicado como um dos concorrentes ao Oscar devido ao pensamento binário que vige no Ocidente atualmente. Segundo esse raciocínio, há apenas duas trincheiras: atrás de uma estão tipos como Lula e Bernie Sanders; atrás da outra estão Trump e Bolsonaro. Hollywood não gosta de Trump e Bolsonaro; logo, gosta de uma louvação a Lula, como é Democracia em Vertigem. Eu não entro nessa conversa. Entre o podre e o péssimo, eu passo.

DAVID COIMBRA

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