quarta-feira, 19 de agosto de 2015



19 de agosto de 2015 | N° 18266 
MOISÉS MENDES

Infernos lacerdistas


Pouco antes do segundo turno da eleição para a Presidência, conversei com quem me ajudasse a entender o que se poderia esperar de cenários com governos do PT ou do PSDB. O cientista político Bolívar Lamounier me disse:

– Se o Aécio vencer, o PT transformará tudo num inferno.

Os petistas seriam “rancorosos, sem nenhum senso de responsabilidade em relação ao país” e fariam “oposição sistemática, sem trégua”. Penso na declaração de Lamounier, homem identificado com os tucanos, e nesse inferno que arde agora com personagens invertidos.

Os tucanos infernizam a vida de Dilma. O PSDB tem meia dúzia de botões para acionar e esparramar o fogaréu: o impeachment, a partir de um parecer do Tribunal de Contas da União, ou a cassação do mandato, pela desaprovação das contas da campanha pelo Tribunal Superior Eleitoral, ou a sangria lenta e cruel, até que a economia se degrade, que ninguém mais confie em ninguém e o país seja jogado no abismo.

Na semana passada, parecia que a temperatura no inferno havia sido reduzida. E, depois das passeatas, que não foram demolidoras, o pior teria passado. Mas, na manhã de segunda-feira, o ex- presidente Fernando Henrique largou uma nota na internet e empurrou lenha seca para o inferno.

Disse que Dilma deveria renunciar ou assumir que errou e provar que tem condições de recuperar o país. O governo, disse FH, “é legal mas ilegítimo”. Eu, você, a torcida do Flamengo e os crédulos ficamos a nos perguntar: o que levou FH a mudar de postura, um dia depois dos protestos, numa nota com uma linguagem aeciana, dura, fora dos padrões retóricos do príncipe dos sociólogos?

Alguém, perto da fornalha, pode ter cobrado mais participação de FH. A nota aponta discordância com “os conchavos de cúpula”. O tucano manda dizer que desaprova os movimentos de distensionamento de empresários e de parte do PMDB.

Na renúncia, Dilma e Temer teriam que deixar o governo para que houvesse nova eleição, o que favoreceria Aécio. Se Temer ficar, conduz o governo até 2018. É o que Serra e Alckmin desejam. Os tucanos estão atrapalhados.

A leitura mais óbvia da nota de FH é essa: ele já não aposta no êxito da tentativa de impeachment e da cassação do mandato, ou torce contra Aécio, o menos confiável de todos para o PSDB. A renúncia de Dilma seria um troféu aceitável no momento.

O inferno montado pelos tucanos confunde e constrange até os diabos lacerdistas que atearam fogo em Getúlio.