sábado, 22 de agosto de 2015



23 de agosto de 2015 | N° 18271 
MOISÉS MENDES

Os delegados
A jornalista Sônia Bridi ressuscitou no Fantástico de domingo passado um dos mais patéticos desfechos de investigações policiais no Brasil. Em 2004, a Polícia Federal acionou a Operação Chacal de busca e apreensão contra o banqueiro Daniel Dantas.

Dantas, do banco Opportunity, era acusado de atividades mafiosas, como espionar concorrentes na área da telefonia. Em 2008, chegou a ser preso, desta vez na Operação Satiagraha, por corrupção e crimes financeiros. Escapou, nos dois casos.

Dantas aparece na reportagem de Sônia, belo e solto, como beneficiado por uma sucessão de “erros”. A busca e apreensão de 2004 estendeu-se do terceiro andar do prédio do Opportunity para o 28º, por causa de uma confusão da operação e do mandado judicial.

Como erraram de andar, o Supremo anulou tudo em 2011. Também a Operação Satiagraha foi anulada porque o delegado Protógenes Queiroz teria chamado a TV Globo para filmar o flagrante de tentativa de suborno de um delegado.

Outros “erros” do juiz federal do caso e até o suposto uso de arapongas da Agência Brasileira de Inteligência nas investigações determinaram que a Satiagraha não valia nada. Protógenes foi forçado a licenciar-se, elegeu-se deputado federal em 2010 (não se reelegeu em 2014) e hoje ninguém sabe onde anda.

Sônia Bridi mostra desolação com formalismos, espertezas e barbeiragens que colocam tudo a perder. Eu queria vê-la tratando da Lava-Jato, com a mesma abordagem – o comportamento da polícia.

Já há material. No dia 13 de novembro do ano passado, a jornalista Julia Duailibi, de O Estado de S. Paulo, mostrou como uma turma de delegados da Lava-Jato se divertia no Facebook. Tiravam sarro do PT, de Dilma e Lula e exaltavam Aécio.

“Esse é o cara”, escreveu no dia 18 de outubro o delegado Igor Romário de Paula – coordenador da força-tarefa da Lava-Jato – na legenda de uma foto de Aécio com mulheres. Seu grupo de colegas delegados no Face era a Organização de Combate à Corrupção, com uma caricatura de Dilma como símbolo.

Igor postou uma reportagem da revista britânica The Economist, em que se lia que “o Brasil precisa se livrar de Dilma e eleger Aécio”. O delegado divulgava propagandas oficiais do site do tucano.

Outro delegado, Márcio Anselmo, que também coordenou a Lava-Jato, escreveu no Face: “Alguém segura essa anta, por favor”. A anta era Lula. O mesmo policial comenta pedidos de habeas corpus em favor de presos e diz: “Vamos ver agora se o STF aguenta ou vai Danieldantar”. Referia-se ao caso Daniel Dantas.

Mais um delegado, Maurício Grillo, compartilhou propaganda do PSDB. Grillo investigou a denúncia de um delegado e de um agente da PF de que Youssef teve conversas gravadas ilegalmente na cela pela própria PF (sabe-se agora que o delegado e os agentes podem ser punidos). E a delegada Erika Mialik escreveu um dia: “Dispara a venda de fraldas em Brasília”.

As autoridades torcedoras divertiram-se como adolescentes. Todos continuam atuando. No começo de agosto, ouvi uma entrevista do delegado Igor à Rádio Gaúcha em que ele ri dos comentários que fazia no Facebook. Igor é o chefe da equipe que prende doleiros, empreiteiros, diretores da Petrobras, cunhadas, irmãos e, pelo que dizem, pode também, a qualquer momento, prender Lula.

Novas reportagens sobre estranhos delegados podem estar à espera da grande Sônia Bridi. Que tempos de exemplos éticos e moralmente enriquecedores.