terça-feira, 4 de agosto de 2020


04 DE AGOSTO DE 2020
NÍLSON SOUZA

Querido agosto

Sempre que posso, faço um texto de desagravo ao mês de agosto, tão mal falado nestes tristes trópicos, principalmente por causa da rima rica com a palavra desgosto. Segundo alguns historiadores, a superstição rimada surgiu em Portugal na época dos descobrimentos, e sua versão original seria a seguinte: "Casar em agosto traz desgosto". Tinha lógica: era no verão europeu que as caravelas partiam para o mar sem fim - e as damas de então, muitas recém-casadas com marinheiros, corriam o risco de ficar viúvas logo depois da lua de mel.

Também diziam os nossos avós - e o dito se repete até hoje, ainda que um dos alvos da maledicência tenha adquirido status de membro da família - que agosto é o mês do cachorro louco. Para isso há uma explicação zoológica, de que a época de maior incidência de cadelas no cio provoca mais brigas entre os machos da espécie, com a consequente proliferação da raiva canina. Seja como for, sobrou para o mês.

Outro desacato ao meu mês de nascimento (era óbvio que o cronista tinha interesse pessoal nisso) é a afirmação leviana de que o 13 de agosto, especialmente quando cai numa sexta-feira, é o dia mais agourento do ano. Ora, agourento é o dia em que não assumimos o protagonismo pelos nossos atos. Qualquer dia, portanto. Depende de cada qual. Além disso, 13 de agosto é o dia mundial dos canhotos - 10% da população mundial, incluindo aí gente ilustre como Albert Einstein e Leonardo da Vinci. Chega?

Agosto, senhoras e senhores, é o prenúncio da primavera. Numa visão mais poética, pode ser considerado o berço do inverno, onde as sementes dormem o seu sono fecundo para explodirem em cores e flores no mês seguinte. É, portanto, o período das transformações silenciosas. Quem sabe não será este agosto que já avança pelo calendário o mês da superação destes tempos sombrios de tantas perdas e privações?

Querido agosto, este filho inconformado com tua injusta fama confia no teu poder regenerador, na força dos teus ventos imprevistos para varrer nossos temores e na magia das tuas manhãs frias que fortalecem o gosto pela vida.

Aliás, bom gosto também rima com agosto.

NÍLSON SOUZA

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