sábado, 10 de junho de 2017



10 de junho de 2017 | N° 18868
RELACIONAMENTO

Quem ama briga


Não tem relação sem D.R. A boa notícia é que você pode ter discussões mais construtivas com seu par. Saiba como

Não finja que este assunto não é com você. Quem tem alguém para trocar presentes e carinhos neste dia 12, muito provavelmente já quis espremer o suco da sua metade da laranja em algum momento. Quem ama briga. Mesmo em relacionamentos saudáveis.

Mas alguns problemas de relacionamento se repetem, levam a novas brigas e irritam de tal maneira que cansam. Às vezes, levam casais a pensar se uma rotina de conflitos em looping está valendo a pena.

Donna questionou suas leitoras no Facebook sobre quais brigas faziam com que elas cogitassem, ainda que não concretizassem, voltar à solteirice. Em poucos minutos, dezenas de comentários surgiram (confira alguns, anônimos, na página ao lado) listando reclamações com duas peculiaridades: repetem-se em um coral de diferentes bocas e são interligadas entre si.

Falta de diálogo, acomodação, indecisão e desatenção a questões práticas do dia a dia são exemplos de problemas mais comuns.

Especialistas trazem boas notícias: se relacionamento é sinônimo de discussão, ao menos há maneiras de tornar essas brigas mais “construtivas” do que “destrutivas”. Existe, inclusive, um grupo especializado nisso na UFRGS. O Núcleo de Pesquisa Dinâmica das Relações Familiares, coordenado pela psicóloga Adriana Wagner, estuda o tema desde 2010, quando iniciou uma pesquisa com 750 casais gaúchos.

– Há um mito de que o casal é um sistema fechado, vem daí o “em briga de marido e mulher não se mete a colher”. E isolados, os relacionamentos fenecem. A conjugalidade é, sim, um tema em que você pode ter ajuda – declara Adriana.

A partir da pesquisa, o núcleo da UFRGS criou o Viver a Dois, um programa de seis encontros destinado a casais juntos há mais de seis meses (para saber mais acesse ufrgs.br/relacoesfamiliares). Ali, os casais aprendem estratégias que vão desde formas de fazer o parceiro entender melhor o que você está sentindo até negociar para que as duas partes saiam de um conflito satisfeitas. A primeira dica é tão simples quanto difícil de cumprir: não brigar justamente quando mais sentir vontade de brigar.

– É natural que ocorra ao casal discutir quando o problema surge, mas é ruim quando um casal debate um impasse ainda impregnado de emoções muito fortes. Às vezes, é preciso dizer para si e para o outro que está com muita raiva para discutir naquele momento – recomenda a psicóloga Patrícia Scheeren, também do núcleo da UFRGS.

Porém, tão importante quanto evitar uma discussão no momento da raiva é voltar a ela mais tarde, de forma que aquele sentimento não forme um passivo de mágoa em relação ao outro. E quando se volta ao assunto, é mais eficiente dizer a outra pessoa como ela fez você se sentir, o motivo da sua insatisfação, do que fazer uma acusação.

Após ter dedicado o seu doutorado a táticas de resolução de conflitos conjugais, a psicóloga catarinense Simone Azeredo Bolze dá um exemplo vindo do seu consultório:

– Uma paciente reclamava que o marido passava um turno inteiro em casa por semana, mas que só limpava o banheiro naquele dia, conforme o combinado entre eles, depois de ela chegar em casa. Ele argumentava que não via diferença entre fazer a tarefa no turno livre ou à noite. Perguntei, eu mesma, qual era a diferença. “É que se ele tira uma hora para limpar o banheiro nesse horário, é uma hora que ele não fica no sofá comigo”. Era isso que ela tinha de dizer a ele, entende?

A estratégia é tornar o parceiro empático ao seu sentimento, já que dificilmente uma pessoa quer deliberadamente fazer mal ao outro ao fazer algo que incomode. Isso evita, também, que a pessoa instintivamente se veja como injustiçada diante de um apontamento do outro.

– Se você disser ao outro que ele nunca escuta o que você fala, ouvirá de volta que é besteira. Mais eficiente é apontar uma situação específica em que a outra pessoa ignorou um comentário seu. E então dizer como aquilo fez você se sentir diminuída – compara Simone.

A esse processo, Patrícia chama de “dar um nome” ao sentimento:

– Muitas vezes, uma briga começa sem nem sabermos exatamente o porquê. Quando vê, o casal está discutindo. Deixar para discutir uma questão de cabeça fria e, nesse meio-tempo, pensar no motivo da própria insatisfação com o relacionamento deixa a situação mais clara para você. Depois, fica mais fácil de debater com o companheiro.

Por fim, as especialistas apontam que uma forma de ter discussões mais produtivas é estabelecer como regra que todo impasse deve ser solucionado com os dois lados cedendo em um ponto e ganhando em outro. Se incomoda almoçar todo domingo na casa da sogra, a solução pode ser combinar um final de semana mensal de viagem em troca. Se o parceiro nunca decide para onde sair de férias (e tampouco deseja decidir), combine de você decidir o destino e ele reservar passagens e hotel. Assim por diante.

O lado alentador de tudo isso é que a ocorrência de conflitos é algo absolutamente normal em relacionamentos, mesmo os mais felizes. Adriana tem isso contabilizado em números. Apesar dos pratos quebrados revelados em inúmeros outros índices, 85% dos casais de sua pesquisa relatavam bons níveis de qualidade conjugal.

Então, feliz Dia dos Namorados e boas (e produtivas) brigas.

CAUE FONSECA