quarta-feira, 14 de junho de 2017



13 de junho de 2017 | N° 18870 
DAVID COIMBRA

Quem será absolvido e quem será condenado

O bom das camadas superiores da Justiça brasileira é que elas são previsíveis. Você sabe que essa Justiça topetuda se comporta de acordo com o topete do réu. Dá para dizer de antemão o resultado do julgamento. Por exemplo:

Temer foi absolvido pelo TSE e levou Dilma junto com ele. Mas, se fosse apenas Dilma a ré, ela seria condenada.

Delcídio foi expulso do parlamento como um Caim, atirado à masmorra como um Conde de Monte Cristo e por pouco não foi queimado vivo como um Giordano Bruno. Mas Renan, pelos mesmos crimes, foi absolvido como um Barrabás.

Collor foi cassado e perdeu os direitos políticos por causa de um Fiat Elba mal explicado. Lula, que nada explica, estará salvo se for levado aos tribunais superiores. Fernando Henrique e Sarney, é óbvio, nunca seriam condenados por nada. Mas Aécio Neves é um pato.

Aliás, um parêntese: é de assustar a fragilidade política dos dois candidatos que passaram para o segundo turno em 2014. Cada um deles, Dilma e Aécio, recebeu 50 milhões de votos. Imagine 50 milhões de pessoas saindo de casa para ir votar em você. É muita gente. É muito importante. Devia ser um patrimônio seguro, uma poupança de apoio que daria sustentação a ambos por muitos anos. 

Mas eles não são nada. No caso de Aécio, menos do que nada. Dilma ainda tem o fanatismo dos petistas a lhe dar certa ilusão de suporte. Aécio, nem isso. O PSDB, já escrevi outra vez, é um partido de isopor. É como a água: insípido, incolor e inodoro. Ninguém é peessedebista de verdade, com a provável exceção de Gilmar Mendes.

É verdade que isso é até bom. Quando o PSDB finalmente se extinguir, será como a antiga civilização hitita, que sabemos que existiu, mas com a qual ninguém se importa, salvo dois ou três antropólogos. E, talvez, Gilmar Mendes.

Essa metáfora de civilizações extintas funciona bem na política brasileira. Porque elas se extinguem, mas não deixam de existir. Pense, por exemplo, nos sabinos. Os sabinos viviam tranquilamente no Lácio, até que os romanos chegaram. Por algum tempo, eles conviveram em paz, tanto que os romanos os convidaram para uma festança. 

Os sabinos aceitaram, foram e comeram e beberam à grande. Com a barriga pesada pela comida e a cabeça leve pelos vapores do álcool, os sabinos adormeceram. Acordaram sob a ponta das espadas romanas. Foram expulsos da cidade, mas as mulheres deles ficaram – a população de Roma era basicamente masculina e o rapto das sabinas foi a maneira mais prática que o rei da cidade, Rômulo, encontrou para resolver o problema da preservação da espécie.

Mas a afronta não ficou assim. De volta à casa, os sabinos se reorganizaram e marcharam sobre Roma para se vingar e retomar suas filhas e irmãs. A guerra durou algum tempo, até que as próprias sabinas resolveram intervir. Argumentaram com seus compatriotas:

– Se vocês perderem a guerra, ficaremos sem nossos pais e irmãos; se vocês vencerem, ficaremos sem os nossos maridos. Queremos a paz.

Desta forma, o bom senso feminino suplantou o orgulho masculino e as duas cidades se uniram em aliança. O que foi feito dos sabinos, que não se falou mais neles depois disso? Viraram romanos. Foram a Roma e se misturaram com os antigos agressores. Os sabinos não desapareceram; se transformaram.

É o que acontecerá com os desmoralizados partidos brasileiros. PMDB, PT, PSDB e PP serão desmembrados e seus integrantes se homiziarão debaixo de outras siglas. Parecerá tudo novo, e será sempre o mesmo. Serão absorvidos e passarão seu DNA adiante, como os sabinos aos romanos.

Você dirá que tergiversei. Comecei com a alta Justiça e terminei na baixaria política. Mas não é a mesma coisa? Os juízes mais elevados não são indicados pelos políticos que um dia poderão julgar? Eles são iguais. Por isso são previsíveis. Sabemos como tudo começou. E como vai acabar.