segunda-feira, 26 de junho de 2017


26 de junho de 2017 | N° 18881
REPORTAGEM ESPECIAL

A CRISE COMO HÓSPEDE


REDE HOTELEIRA DE PORTO ALEGRE passa do entusiasmo pré-Copa do Mundo para recessão que impacta os negócios. Desde o Mundial, 12 hotéis encerraram atividades

Após o otimismo com a Copa do Mundo deixar como legado um excesso de leitos em Porto Alegre, a crise não quer fazer o check out na rede hoteleira. Além do aumento da oferta também insuflado pela promessa de que o país entrava em uma era de crescimento duradouro, a recessão que veio em seguida frustrou as expectativas e afastou ainda mais a clientela dos hotéis da Capital, formada em grande parte por quem viaja a negócios ou para eventos.

Os dados do Sindicato de Hotéis de Porto Alegre (SHPOA) mostram que, ao longo de 2014, a melhor taxa média de ocupação na cidade foi de 62% em junho daquele ano, quando a cidade sediou jogos da competição de futebol. Agora, amarga percentual de 47%, com mais leitos fechando do que abrindo. Conforme a entidade, antes do evento esportivo a Capital tinha cerca de 16 mil leitos. A euforia com a Copa fez diversas redes apostarem em novas unidades, o que elevou a oferta para cerca de 19 mil. 

Agora, são em torno de 18 mil, diz o presidente do SHPOA, Carlos Henrique Schmidt. Após a Copa, 12 hotéis encerraram as atividades e um opera com apenas metade da capacidade, o que significou o enxugamento de 1,3 mil leitos. Hoje, são 119 empreendimentos na cidade.

– Estamos no limiar entre o azul e o vermelho. A crise nos pegou no contrapé – lamenta o dirigente, que admite a sobreoferta causada pela Copa e cita o aumento dos custos como outro fator que mina a rentabilidade.

Schmidt lembra que, no caso da Capital, o movimento na rede é muito ligado ao turismo de negócios, que minguou devido à crise na economia. Com a recessão persistente, as viagens para tratar de assuntos corporativos ou transações foram substituídas por opções mais econômicas, como videoconferências. Ao mesmo tempo, diminuiu o número de eventos. Mesmo os mantidos viram o número de participantes cair.

Com a demanda retraída, apenas dois hotéis abriram em Porto Alegre depois da Copa – um foi neste ano, da bandeira Intercity, na Cidade Baixa. O reflexo no mercado de trabalho foi direto. Segundo o SHPOA, em 2016 o setor gerava cerca de 5 mil empregos. Hoje, está na faixa de 4 mil, calcula a entidade.

Outra organização do setor, a Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH), trabalha com números um pouco diferentes, mas que também mostram a retração. Segundo a entidade, a Capital tinha cerca de 10 mil quartos em 2014 (em média, dois leitos por quarto) e, agora, são cerca de 8 mil disponíveis. O número de empregos, diz o diretor de planejamento estratégico da ABIH no Estado, José Justo, caiu de 4,5 mil para 2,7 mil.

No Rio Grande do Sul, o setor também sentiu o baque na economia, com reflexos em outras regiões, como Serra e Litoral, onde o fluxo é mais ligado ao lazer. O impacto, diz Justo, não veio com o fechamento de hotéis, mas com queda da ocupação e preço menor das tarifas.

– O valor médio das diárias no Estado caiu mais de 20%, de 2014 para 2016. Em 2017, talvez consigamos recuperar algo como 10% a 15% – diz o dirigente, que afirma notar leve melhora na economia e na ocupação nos últimos meses, movimento que considera vinculado principalmente à safra recorde no Rio Grande do Sul.

De acordo com a ABIH, após a taxa de ocupação média no Estado chegar a 38% em 2015, neste ano está em 53%. Uma das explicações da melhora no percentual é a oferta menor de quartos, com o fechamento de hotéis na Capital.

Na tentativa de reverter o quadro, o Porto Alegre Convention & Visitors Bureau passou por recente mudança de direção. O esforço é para, no curto prazo, fazer iniciativas em conjunto com a rede hoteleira, clubes de futebol, comércio e gastronomia para atrair, principalmente, mais pessoas do Interior para a Capital (leia na página ao lado). 

Em prazos mais longos, trabalhar para Porto Alegre se tornar mais competitiva na atração de grandes eventos. Ao mesmo tempo, o setor torce por ações que são alheias à iniciativa privada, como melhor segurança e limpeza na cidade, principalmente no Centro Histórico, e a finalização das obras de revitalização da orla do Guaíba.

caio.cigana@zerohora.com.br