sábado, 1 de agosto de 2020



01 DE AGOSTO DE 2020
OPINIÃO DA RBS

COMO BARRAR AS MILÍCIAS DIGITAIS

Dois casos recentes envolvendo agressões e ataques organizados por meio de milícias digitais - contra ministros do STF e o influenciador Felipe Neto - servem de parâmetros sobre o que as instituições e a sociedade não devem ou, ao contrário, podem fazer em relação aos bandos que se valem da internet para difundir fraudes, assacar reputações e tentar destruir adversários. No primeiro caso, por mais deletéria e repugnante que seja a ação das quadrilhas digitais que hostilizam instituições democráticas, o ministro Alexandre de Moraes enveredou pelo condenável caminho da censura prévia para tentar silenciar detratores. 

Ao determinar em uma penada que plataformas digitais retirassem do ar páginas e contas de bolsonaristas investigados, o ministro deu contornos censórios a seu ato porque, ainda que vários posts possam ser enquadrados em crimes de injúria e difamação, outros são meras críticas ou manifestações de opinião. E mesmo potenciais crimes digitais não podem, pela Constituição, ser alvos de censura a priori.

É realidade que o sistema jurídico é lento e falho, mas se uma investigação independente identificar, com a velocidade que o ritmo digital exige, atos delituosos e der sequência ao processo, aos criminosos caberá responder por seus crimes. Caso contrário, envereda-se no Brasil por um arriscado caminho da autoridade judicial que dita, a seu bel-prazer, o que pode ser divulgado ou não. Não surpreendente, portanto, que o próprio presidente do STF, Dias Toffoli, tenha assumido publicamente a condição de "editor" do país. Esquece o ministro que ao Supremo não é autorizada essa condição que, de toda sorte, responde - a posteriori - por eventuais delitos de opinião.

A sequência de equívocos em relação às fanáticas milícias bolsonaristas teve início em um inquietante inquérito instalado e julgado pela mesma autoridade, e chega às bordas da censura, da ineficácia e - ao proibir manifestações em escala mundial - também de uma aberração jurídica e tecnológica. Com a perseguição a manifestações digitais, tão inútil como tentar conter torrentes de água com pedregulhos, o STF corre o risco de sofrer a ridicularização internacional de sua decisão, além de ajudar a guindar os bandoleiros digitais à condição de vítimas, quando, na verdade, deveriam responder normalmente por eventuais crimes. É preciso, portanto, mais prudência na condução do tema.

Age melhor o youtuber Felipe Neto, alvo dos pistoleiros de internet depois de o jornal The New York Times divulgar um vídeo do brasileiro, que classificou Jair Bolsonaro como o pior gestor mundial no enfrentamento da pandemia. Gangues bolsonaristas fraudaram um post para tentar impingir a Felipe Neto a condição de pedófilo e passaram a difundi-lo aos borbotões. O influenciador agiu corretamente. Teve seu caso amplamente exposto pelos veículos de comunicação, que identificaram a fraude e deram visibilidade aos ataques virtuais, desmontando o repulsivo movimento do esgoto digital. Em paralelo, Felipe Neto constituiu advogado para processar os difamadores. Se a autoridade policial perseguir a trilha do dinheiro, chegará aos mentores.

Valorização do jornalismo profissional e identificação dos milicianos digitais, com o devido julgamento e responsabilização da cadeia de difamação, sempre com respeito à Constituição. Esse é o caminho para, no abrigo da lei e na proteção da democracia e da liberdade, se dar um basta aos bandoleiros da internet.


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