segunda-feira, 12 de agosto de 2019



12 DE AGOSTO DE 2019
FINANÇAS

Indignação, frustração e esperança

Por trás dos 60,2 mil precatórios na fila de pagamento do Estado, há gente como a pensionista Honorina Falcão Müller, 74 anos, o aposentado Sadi Domingos Gobatto, 80 anos, e os irmãos Vito, 76 anos, Sergio, 68 anos, e Dorvalino Gobbo, 72 anos. Todos eles aguardam o dinheiro devido pelo governo. Apesar das frustrações, não perderam a esperança de conseguir.

Orientada pelo Sindicato dos Servidores Públicos Aposentados e Pensionistas do Rio Grande do Sul (Sinapers), Honorina entrou na Justiça contra o Estado em 2007, quatro anos após a morte do marido, o servidor público Harry Müller. Ele faleceu aos 70 anos, sem ter recebido aumento salarial aprovado no governo de Antônio Britto (então no PMDB), o que levou a pensionista a buscar reparação judicial. O precatório foi inscrito para pagamento no orçamento de 2018. Até a última sexta-feira, estava na posição número 7.128 da fila.

- Meu marido trabalhou por 45 anos na Secretaria da Agricultura. Era muito dedicado ao trabalho e respeitado pelos colegas. É triste ter de esperar tanto tempo por um direito, mas, se Deus quiser, vai dar certo. Espero que o governo faça alguma coisa - diz Honorina.

A expectativa é compartilhada por Gobatto e pela família Gobbo. Desde 2015, Zero Hora acompanha a sina dos moradores da Linha Vitória, em Carlos Barbosa, na Serra. Há mais de três décadas, eles tiveram as terras cortadas ao meio pela Rota do Sol (RS-453). Para receber indenização, eles se tornaram precatoristas.

De lá para cá, Vito vendeu um de seus títulos por 37% do valor original e Sergio aguarda acordo com o Estado - na última quinta- feira, a Câmara de Conciliação formalizou proposta, e Sergio planeja aceitar. Quanto aos outros dois, continuam sem perspectivas.

- O jeito é continuar aguardando. Fazer o quê? A esperança é a última que morre. O Vito ainda conseguiu alguma coisa, mas perdeu dinheiro, né? - afirma Gobatto, que, até sexta, estava na posição 23.587 da fila.

Cansado da demora, no fim de 2018, Vito decidiu aceitar a oferta de uma empresa interessada em adquirir precatórios para abater dívidas tributárias. Apesar do prejuízo, ele diz que não se arrependeu do negócio. O temor de morrer sem receber nada falou mais alto. Vito ainda tem um segundo precatório, herdado do pai e compartilhado com os irmãos, que permanece na fila.

- Reparti o dinheiro com meus filhos, que estavam precisando. É claro que saí perdendo, mas ia esperar até quando? Não dava mais para continuar assim - diz Vito.

Por que a dívida cresceu menos em 2019

a) Conciliação e compensação

Para reduzir a dívida de precatórios, o governo do Estado criou a Câmara de Conciliação, em 2015, e o programa Compensa-RS, em 2018. O impacto ainda é pequeno diante do tamanho do passivo, mas, ainda assim, contribui para a redução e tende a avançar.

b) Leis Britto

A onda de sentenças decorrentes das leis Britto, que por anos foi uma das principais causas da explosão da dívida de precatórios, começa a arrefecer. As leis Britto remontam a 1995/1996, quando o então governador Antônio Britto (na época no PMDB) aprovou reajustes salariais para os servidores e não pagou.

c) Opção por RPVs 

Sempre que alguém ganha uma ação contra o Estado com valor de até 10 salários mínimos, o crédito vira Requisição de Pequeno Valor (RPVs). Se a cifra for maior, torna-se precatório. Como as RPVs são pagas com maior rapidez, muita gente opta por receber menos (via RPV) para não ter de esperar tanto.

O QUE SÃO PRECATÓRIOS

São dívidas do poder público resultantes de ações judiciais superiores a 10 salários mínimos (R$ 9,98 mil). No caso do Rio Grande do Sul, decorrem principalmente de questões salariais (envolvendo servidores ativos, inativos e pensionistas), desapropriações e cobranças indevidas de impostos.

A FILA DO ESTADO

60,2 mil são os precatórios à espera de pagamento no TJ

COMO FUNCIONA O PAGAMENTO

O valor repassado mensalmente pelo Estado (cerca de R$ 50 milhões) é dividido da seguinte forma:

1) Por ordem cronológica

A quitação é feita pela apresentação do título, isto é, do mais antigo ao mais novo. Em caso de precatórios de natureza alimentar (envolvendo pensões e salários), os credores idosos, com doenças graves ou com deficiência podem pedir o pagamento de parcela preferencial. Aqueles que têm mais de 80 anos e precatório alimentar entram na categoria das “superpreferências”.

2) Por meio da conciliação

O pagamento se dá via acordo, com redução de 40% no valor atualizado dos títulos. A modalidade começou com a criação da Câmara de Conciliação de Precatórios, em 2015.

Desde então, os titulares são chamados na ordem cronológica para negociar com a Procuradoria-Geral do Estado (PGE). Podem aceitar ou permanecer na fila, à espera do valor integral.

RESULTADOS (ATÉ 2 DE AGOSTO)

8.020 precatórios convocados para conciliação (do TJ e da Justiça do Trabalho), em seis rodadas de negociação

4.632 acordos firmados

R$ 692,6 milhões abatidos da dívida (4,4% do total)

Compensação de dívidas

Em março de 2018, o governo estadual lançou o programa Compensa-RS, que segue até 2024. Funciona assim: quem tem débitos tributários com a Receita Estadual inscritos até 25 de março de 2015 como dívida ativa (aquela que o Estado tem a receber), pode oferecer precatórios para regularizar a situação junto ao Fisco. É a compensação de um passivo por outro.

RESULTADOS (ATÉ 2 DE AGOSTO)

441 pedidos de compensação registrados e efetivados

3.350 precatórios oferecidos para compensação, no valor bruto de R$ 1,1 bilhão

R$ 674 milhões em títulos efetivamente compensados (4,3% da dívida)

Nenhum comentário:

Postar um comentário