segunda-feira, 17 de julho de 2017


17 de julho de 2017 | N° 18899
REPORTAGEM ESPECIAL

PERCENTUAL DE INATIVOS BATE RECORDE


APOSENTADOS DO EXECUTIVO representaram 54,1% da folha de abril e superaram em 23,2 mil o número de vínculos de servidores públicos em atividade. Desequilíbrio é motivo de preocupação

Enquanto o debate sobre a reforma da Previdência patina no Congresso, o percentual de servidores estaduais inativos bate recorde no Rio Grande do Sul e pressiona as finanças do Estado. Ao final do primeiro quadrimestre do ano, eles representaram 54,1% da folha de pagamento do Poder Executivo, com 153,2 mil vínculos – mais do que a população de municípios como Bagé, Sapucaia do Sul e Uruguaiana.

No início da gestão do governador José Ivo Sartori, em 2015, os ativos ainda eram maioria. De lá para cá, o número caiu 10,5%, e as despesas com os funcionários públicos aposentados tiveram aumento real (acima da inflação) de 8,7%, chegando a R$ 763,9 milhões em abril (veja gráfico da folha de pagamento e do número de vínculos). O valor supera a capacidade anual de investimento do Estado.

Como existem 9,8 mil pessoas aptas a se aposentar somente em 2017, a tendência é de que os gastos sigam crescendo e aprofundando o rombo previdenciário.

Em teoria, as contribuições dos servidores ativos deveriam ser suficientes para financiar os benefícios dos inativos, mas a matemática não fecha há tempo. Em 2016, o Estado teve de cobrir déficit de R$ 8,97 bilhões, recurso que poderia ter sido aplicado, por exemplo, em saúde e educação.

– Ao mesmo tempo que vemos crescer barbaramente o número de inativos, há um descolamento do ponto de vista financeiro, porque, na maioria dos casos, eles acumulam vantagens e se aposentam ganhando mais. Não quero dizer, com isso, que não mereçam esses benefícios. A questão é que a sociedade precisa saber disso para compreender as limitações que esse desequilíbrio impõe – diz o secretário estadual da Fazenda, Giovani Feltes.

Parte do problema se explica pelo fato de que, entre o fim dos anos 1970 e a década de 1980, os ocupantes do Piratini fizeram contratações em massa para ampliar a oferta de serviços públicos. O erro foi ter demorado a fazer ajustes capazes de dar sustentabilidade ao sistema previdenciário e arcar com as futuras aposentadorias.

REFORMA DO REGIME GERAL OFUSCA NECESSIDADES NO SETOR PÚBLICO

Em 2011, o ex-governador Tarso Genro (PT) deu o primeiro passo, lançando um fundo de capitalização. Em 2015, Sartori avançou ao criar a aposentadoria complementar.

Apesar de importantes, as medidas contemplam apenas novos servidores e levarão anos para surtir efeito. Na melhor das hipóteses, o buraco na Previdência vai parar de crescer a partir de 2023.

Até lá, o Estado seguirá enfrentando dificuldades para repor quadros e manter serviços essenciais, não só pela falta de recursos em si, mas pelas imposições da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). A norma limita a 49% da receita as despesas com pessoal no Poder Executivo, incluindo ativos e inativos. Ao final do primeiro quadrimestre de 2017, o índice ficou em 44,6%. Mesmo que Sartori tivesse dinheiro para suprir automaticamente todas as vagas abertas por aposentadorias, correria o risco de ser punido por extrapolar o teto da lei.

O impasse se repete em outros Estados, mas o caso do Rio Grande do Sul preocupa o economista Cláudio Hamilton dos Santos, técnico do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Ele é um dos autores de ampla pesquisa nacional sobre o tema (leia mais na página ao lado).

– Na maior parte dos Estados, o número de inativos ainda não superou o de ativos. No Rio Grande do Sul, o quadro é extremo. Há pelo menos uma década o governo não consegue repor os aposentados. De 2006 a 2015, a queda no número de ativos foi de quase 20% – afirma Santos.

A solução, na avaliação do economista, passa por alterações na Previdência pública, cujas discussões acabaram eclipsadas pelas polêmicas envolvendo o regime geral e pela crise política que recai sobre o governo de Michel Temer.

– Nos próximos 10 anos, cerca de 40% dos servidores públicos brasileiros vão poder se aposentar, sem que os entes consigam restituir as vagas. As pessoas ainda não se deram conta do problema que isso vai causar – adverte o pesquisador.