quinta-feira, 20 de julho de 2017



20 de julho de 2017 | N° 18902
DAVID COIMBRA

Sant’Ana e eu

Tive um contencioso com o Sant’Ana, todo mundo sabe. Foi uma briga feia e, o pior, transmitida ao vivo pelo poderoso microfone da Rádio Gaúcha. Lamento por essa briga, mas não me arrependo de ter brigado. Brigaria de novo, e com a mesma intensidade, se de novo acontecesse o que aconteceu entre nós.

Depois daquele episódio, nós nunca mais nos falamos, do que também não me arrependo e o que também lamento. Lamento porque gostava do Sant’Ana. Era uma pessoa afetiva, inteligente e, mais do que tudo, interessante. O Sant’Ana, definitivamente, não era um ser humano comum.

Sempre digo que nós, jornalistas, somos inquilinos do espaço que ocupamos e não donos dele. Podemos ocupar este espaço de forma competente ou incompetente, com graça ou modorra, estilo ou insignificância. Depende de cada um. Sant’Ana ocupava seus espaços com gana. Era cioso de cada centímetro de jornal, de cada segundo no rádio, de cada quadro na TV. Isso fez de Sant’Ana um jornalista único no Rio Grande do Sul.

Ninguém apareceu mais do que o Sant’Ana, nem jamais aparecerá, porque o Sant’Ana, mais do que aparecer, fazia-se notar.

Ele era assim na vida, na convivência, no comum dos dias. O Sant’Ana nunca passava despercebido por lugar algum. Você tinha de prestar atenção nele, ou ele protestava, ou ele fazia algo que inevitavelmente capturaria o seu pensamento e o seu olhar.

Paulo Sant’Ana subiu no palco de Julio Iglesias, cantou com a governadora do Estado, vestiu-se de Papai Noel Azul e entrou em campo em um Gre-Nal nos Eucaliptos. Paulo Sant’Ana apresentou o Jornal do Almoço vestido de baiana. Paulo Sant’Ana brigou com Loivo, Figueroa, Neca, Ruy Carlos Ostermann, Lauro Quadros, Wianey Carlet, Kenny Braga e com mais um batalhão de outras pessoas, inclusive comigo. Mas nenhum de nós que brigou, conviveu, foi amigo, inimigo, colega do Sant’Ana, nenhum de nós deixou de reconhecer que ele foi um personagem especial de Porto Alegre e do Rio Grande do Sul.

Paulo Sant’Ana faz falta para Porto Alegre. Faz falta para o jornalismo. E faz falta para mim, que um dia fui seu amigo e que sempre entendi que a cidade, com ele, era mais colorida, mais interessante e mais viva.

Porto Alegre se empobrece um pouco sem Paulo Sant’Ana. Todos nós nos empobrecemos. Mas, pelo menos, sabemos que Sant’Ana extraiu da vida cada quadro, cada linha, cada segundo que a vida tinha para lhe dar.