sábado, 9 de março de 2024


09 DE MARÇO DE 2024
J.J. CAMARGO

EM QUEM PÔR A CULPA?

Quando algum projeto dá muito certo, há uma disputa para identificar o pai da ideia. E quanto mais estrondoso o sucesso, mais pulverizada será a paternidade. A maioria das pessoas têm dificuldade de fracionar o mérito, e quando isso é inevitável sempre haverá quem queira fatiá-lo, com a indisfarçada intenção de que a maior das fatias lhe seja atribuída.

Como fomos idealmente planejados para o sucesso, é muito difícil que alguém assuma a autoria quando a coisa toda dá errado. Principalmente porque há um fascínio, pelos órgãos de divulgação em geral, quando o objeto da notícia é um fiasco. O que só confirma que a soma de ambição com vaidade é uma combinação danada, e a mídia é o agente polarizador desse turbilhão de miudezas.

Quando a questão é política, com a visibilidade natural multiplicando os defeitos com muito mais facilidade do que virtudes, mais se percebe que aparentar é muito mais fácil do que ser. E então desfilam figuras bizarras que temos certeza que pensavam diferente, tanto que concordávamos com elas, e que agora não os reconhecemos. E sempre haverá quem tente convencer-nos que nós é que mudamos.

Na vida real, essa em que vivemos tentando sufocar a náusea que a hipocrisia do cotidiano desencadeia, busca-se o equilíbrio entre o que fazemos por prazer e as regras que o politicamente correto instituiu sem consulta pública que se conheça.

Seguindo normas geradas espontaneamente nas redes sociais, assusta a instantaneidade com que pessoas e situações são julgadas e condenadas, sem que nenhum tribunal seja consultado. Com uma enorme chance de injustiça nos julgamentos-relâmpago, resta com frequência a sensação, meio vingança, meio deboche, de que essa é a resposta merecida à morosidade enervante da justiça tradicional.

Quando somos convocados a encarar uma pauta controversa num campo delicado como, por exemplo, a saúde pública, estaremos sempre expostos ao crivo implacável dos que defendem a sua opinião, não importa quanto seja esdrúxula, sem preocupação com sustentação científica.

A falta de dúvidas, essas que embasam a ciência, é a marca registrada dos que não se constrangem em opinar sobre temas dos quais não têm a menor ideia. E geralmente a fonte "inspiradora" da teoria é ignorada ou, para corresponder à modernidade, uma fake news.

Tem sido assim na discussão de terapias alternativas ao câncer, dos cigarros eletrônicos, da liberação de drogas e das vacinas. Sem nenhuma noção do que seja metodologia científica, os arautos dos novos tempos não se intimidam em fazer uma teoria baseada em um caso só, ou, no que é sinal dos tempos, dizem "Eu li em algum lugar!", sem preocupação com o tamanho da lata de lixo que consultaram.

J.J. CAMARGO

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