sábado, 17 de outubro de 2020


17 DE OUTUBRO DE 2020
FABRO STEIBEL

O BEM MAISESCASSO 

A internet gerou um sentimento de escassez eterna entre nós: falta tempo para entender o que acontece ao nosso redor. Falta tempo para verificar se vacinas funcionam, se informações são verdadeiras, se aplicativos promovem emprego ou desemprego. A falta de tempo é, inclusive, um dos elementos secretos para compreender como podemos usar a internet a favor da sociedade.

Veja o caso de verificação de informações durante a eleição. Um boato pode mudar um pleito, e estamos buscando formas de saber se informações são corretas antes de mentiras circularem por aí. Como há muito mais mensagens do que pessoas, jornalistas ou algoritmos capazes de lidar com a demanda, que interessante seria se a informação fosse menos instantânea. O Twitter pensou nisso e vai exigir que você leia as notícias antes de compartilhá-las. E já há quem queira ir além e exigir que políticos com mais de 100 mil seguidores tenham menos acesso a postagens instantâneas do que uma pessoa comum.

Outro exemplo é a revolução que plataformas tecnológicas causam no mundo da logística. Enquanto o iFood é um dos grandes promotores do uso de bicicletas nas cidades, o Uber, uma das grandes fontes de reinclusão no mercado de trabalho, e a Buser, uma aceleradora do mercado de fretamento, sabemos que há externalidades possíveis nessas inovações todas. Qual a responsabilidade das plataformas com a segurança dos entregadores, com direitos trabalhistas ou com modelos de negócio essenciais às cidades?

E o impacto da pandemia de covid-19 na educação? O Conselho Nacional de Educação já anunciou que aulas remotas serão válidas até final de 2021. Isso dá incentivos suficientes para o ensino híbrido virar regra, e o ensino só online, ou só presencial, tornar-se a exceção. Tudo isso acontece mesmo que apenas 28% das escolas adotem alguma plataforma online de ensino, ou que mais da metade dos professores usem celular para atividades com os alunos. Nos faltará tempo para adequar o planejamento escolar, universalizar a conexão e identificar prós e contras desse universo híbrido que já chegou.

Sobre a vacina, ou sobre a cloroquina, então, nem se fala. Os principais jornais acadêmicos estão revendo seus processos de aprovação de artigos científicos para dar conta do impacto da ciência na sociedade. E todo o sistema logístico está correndo contra o relógio para dar conta da logística da vacina, que vai exigir - quase certo - transporte realizado com o produto guardado muitos graus abaixo de zero.

A internet acelerou radicalmente as mudanças na sociedade, e estamos sentindo isso nas atividades mais básicas que constituem as cidades, as empresas, até a família. Quem diria, mas o bem mais escasso da modernidade é justamente o tempo.

FABRO STEIBEL

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